Relacionamento abusivo
A violência contra a mulher vai muito além da agressão física, os insultos e humilhações também são formas de abuso. Cuidar de si mesma é mais importante do que salvar a relaçãoPor Juliana Cruz
No começo, tudo é maravilhoso. Só existem carinhos e promessas de amor, mas, de repente, o afeto dá espaço aos insultos, ameaças e agressões físicas, e o relacionamento passa a ser destrutivo. Essa é a história de muitas mulheres brasileiras que vivem relacionamentos agressivos. A violência contra o sexo feminino geralmente é de origem passional. Entre 2003 e 2007, estima-se que 4 mil mulheres foram assassinadas a cada ano, cerca de 10 mulheres por dia, segundo dados do Mapa da Violência realizado pelo Instituto Sangari.
As relações abusivas geralmente não começam agressivas e por isso é comum a ideia de que o parceiro vai mudar. Elas tentam trazer a harmonia de volta para a vida do casal e muitas vezes atribuem para si responsabilidade em salvar a relação. Segundo Wânia Pasinato, socióloga e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP), o silêncio não é a melhor saída, “a mulher tem que procurar ajuda. Ela não é responsável pela violência e nem deve resolver esse problema sozinha”, adverte.
Engana-se quem pensa que agressão verbal não é uma forma de violência, é justamente a partir dela que os relacionamentos abusivos costumam evoluir. A falta de respeito no diálogo ou no convívio familiar é uma forma de agressão. “Um namorado que utilize palavras agressivas e goste de humilhar a parceira também está cometendo uma violência contra a mulher. O relacionamento abusivo é progressivo e pode levar à morte”, alerta Lívia Lopes, psicóloga, especialista em prevenção e promoção da saúde, coordenadora dos estagiários de psicologia das Delegacias da Mulher e das Delegacias Participativas de São Paulo.
O estresse, os problemas financeiros, o abuso de álcool e drogas, além das questões de gênero, são os principais desencadeadores de agressão. As pessoas criadas em ambientes abusivos costumam ser mais suscetíveis a esses relacionamentos. Elas aprendem esses comportamentos e os reproduzem nas suas famílias. A violência passa a ser considerada natural. Mas a exposição à ambientes agressivos não deve ser encarada como uma sentença. “Há pessoas que passam por essa situação familiar, mas conseguem sair com comportamentos mais positivos, são as chamadas personalidades resilientes”, explica Lívia.
Submissão
Não existe fórmula para explicar o abuso contra a mulher, cada caso tem a sua complexidade, mas Wânya acredita que a submissão esperada das mulheres é um componente importante. Muitas vezes ela é educada à preservar a família, salvar o casamento, ainda que isso signifique não preservar a si mesma. “A sociedade brasileira é extremamente machista. Ela valoriza o comportamento viril masculino e a submissão da mulher. Isso é muito enraizado em todas as relações.
A violência é fruto das relações desiguais de poder entre homens e mulheres”, analisa.
Enraizamento não é sinônimo de imutabilidade. A cultura é produto da sociedade e pode ser mudada. Nos últimos 30 anos, alguns avanços foram feitos para lidar com a violência contra a mulher.
A criação da Delegacia da Mulher, a Lei Maria da Penha, as casas abrigos e os centros de auxílios são avanços nas políticas públicas de segurança. Mas os poucos dados sobre a violência contra a mulher e os casos como o de Eliza Samudio e Mércia Nakashima ilustram que o caminho até a igualdade de gênero e a liberdade é longo.
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